top of page
Foto do escritorArthur Andrade Tree

É VEM ELE…

Adoro quando começo minhas gozações e recebo “é vem ele”. É vem é melhor que “la vem”. É niuma é melhor que não tem problema. Essa lingua apaixonante do brasileiro, esse idioma incrivel, esse lugar único, cada vez que viajo pra longe quero voltar rapido. Ter nascido no Brasil, chegado por Salvador na Bahia, é privilegio. E pelo Santo Antonio além do Carmo, um luxo. Hoje to assim, passadiço. É vem ele!


Foi uma infancia dura mas leve. Ja tive cadernos de papel de embrulho e lápis do Finame. O colegio primário, o Getulio Vargas, tinha merenda escolar, nescau e sopa de letras. Tinha médico de plantão, doutor Marquezine. Ele fumava, tinha cheiro de cigarro, genial. Era lindo ve-lo fumando Continental sem filtro enquanto receitava xarope pra tosse. A gente se sentia seguro com doutor Marquezine. Uma vez ele foi na minha casa cuidar daquela febre e confirmar o sarampo. Era um deus.


Amava aquela escola, o primário, as aulas de Português e os castigos da matemática. Errava a porra da taboada, tremia quando professora Vilma perguntava nove vezes nove. Era um numero muito longe do meu tamanho, muito longe do cinco. Pra mim, taboada devia acabar no cinco. Nove era mil quilometros distante, nunca eu ia chegar lá.


E a professora percorria a sala caçando menino burro e parava em minha pessoa. Arthur, nove vezes nove?? Todo mundo virava pra mim. Eu tinha um orelhão que acendia vermelho. As bochechas pesavam e a bocona sussurrava: 33?


Levanta, discastigo até aprender. E lá ia eu pela quinta vez com a cara pro quadro negro, de costas pra turma, até acabar a aula. Um dia minha irmã Dio passou no corredor e me viu castigado, entrou na sala e ficou de pé do meu lado com a cara pro quadro, solidária até acabar a aula. Finalmente aprendi nove vezes nove. Professora Vilma, onde a senhora estiver, te amo, viu?


Sempre fui meio retado no Português. Professor Cicero Pessoa da Silva me elogiava. Eu tinha uns 11. Professor Cícero do Ginasio do Santo Antonio era um visionário que me fez aumentar meu amor pelo idioma. Eu gostava de inventar historias, adorava mentir. Uma vez ja adulto, prova de Historia Antiga com Waldir Oliveira, em São Lazaro. Prova escrita. Eu não sabia porra nenhuma. Inventei tudo. Contei as maiores mentiras sobre a antiguidade. Os caras que eram herois viraram bandidos. Tirei zero.


A prova foi parar na reuniao do departamento de Historia. Foi um rebuliço. O povo ria e chorava, os professores incriveis fizeram Waldir rever a nota e mudar o zero para três. Afinal, ninguem sabe a historia real e eu poderia estar certo. Tudo verdade, gente, Tereza Aragão me contou morrendo de rir. Tereza se foi, Waldir também, o chefe do departamento Luis Henrique Dias Tavares também se foi. Onde estiverem, também amo vocês.


Mas comecei esse papo sobre a lingua. Vou dizer: adoro falar errado. Ja fui tão certinho, tão chato, tão exigente. Quando dirigi empresa gostava de selecionar as equipes. Fazia um teste simples.

Qual o último filme que vc assistiu? O último?? Filme?? Isso, nao vale novela, é filme de cinema. Não lembra?? Tá bom,

agora escreva ai idiossincrasia e exceção. Era batata. Essessão era o mais comum. Porra, exceção é uma palavra imoral. “Idiocincrazia” é outra imoralidade. Tem várias indecentes. Cabeleireiro, transmutabilidade, paralelelelepipedo…vrido…


Hoje gosto de “sirius postiços” e acho muito muito muito mais poético que cílios. Aliás, cílios são como vassouras organicas limpando a sujeira da casa. Seriam vassouras postiças? Feio, né? Melhor “sirius”.


Um rapaz que trabalhou comigo na roça era um genio das palavras. Gostava de falar difícil. Foi abrir um “procotolo” mas o embargador lá botou desconsentimento. Ele entendia de embargadores, havia trabalhado com um embargador e uma embargadora. Que diabo é embargador?? Gente da justiça, ôôô, parece que não se compreende! Ah, sim, claro!!

Joazinho e todo o povo do mundo que fala errado, tambem amo vcs.

101 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo

BUMERANGUE

Comments


bottom of page